A LÍNGUA portuguesa anda mesmo pelas ruas da amargura na terra onde vivemos. Apesar de constar como língua oficial e de existirem nos serviços públicos muitos funcionários que a «falam», fazer passar a mensagem é cada vez mais complicado, especialmente quando isso é tentado via telefone.
Recentemente, tive de entrar em contacto com a Biblioteca Central, sob a alçada do Instituto Cultural, para pedir informações sobre a forma de envio de exemplares de uma revista para a instituição. Pedi para falar em Português e, por três vezes, tive de tentar a ligação, sendo sempre transferido para uma pessoa que, supostamente, deveria entender a língua de Camões. O problema não era falar, era entender e fazer-se entender. Nenhuma das três pessoas conseguiu perceber aquilo que eu queria esclarecer e que era tão simples como dizer-me o endereço e a pessoa encarregue de receber as revistas!
O caricato de tudo isto foi que sempre que havia dificuldade em compreenderem o que eu queria, insistiam em comunicar em Inglês, nunca reconhecendo que havia falta de entendimento em Português. Aliás, a certa altura, deu-me impressão que me estariam a tentar fazer perceber que o problema de expressão era meu! A uma dessas pessoas cheguei mesmo a perguntar se «saberia falar», ao que me disse: «sabia falar, mas não entendia muito bem o que eu queria»!
O meu propósito era apenas de saber o procedimento para uma revista náutica de Hong Kong, onde colaboro, enviar alguns exemplares para leitura gratuita nas bibliotecas de Macau.
Na primeira tentativa insistiam que se eu «queria visitar a biblioteca teria que me dirigir pessoalmente». Pois! Calculo que uma visita por telefone deveria ser complicada!
Na segunda tentativa, passado o impasse da visita, diziam que sendo eu de Hong Kong (!) teria que lhes enviar uma carta para marcar dia e hora para falar do assunto…
E, da terceira vez, já eu desejoso de falar em Inglês e farto de tanta perda de tempo, fizeram-me saber que, para falar com jornalistas, tinham que pedir autorização superior! Nesta altura já eu estava pelos cabelos a tentar explicar, o mais simples que conseguia, aquilo que queria. Mais parecia uma conversa de loucos, em que eu dizia alhos e o interlocutor entendia bugalhos!
Tudo se resolveu em Inglês. Uma quarta pessoa, usando a língua de sua majestade, entendeu tudo à primeira e sem grandes confusões, esclarecendo que basta a revista de Hong Kong enviar as cópias para a Biblioteca Central, a nome ou ao cuidado do director. Pediu ainda, de forma bastante cordial, que fossem enviadas, pelo menos, cinco cópias para que fossem distribuídas por todas as bibliotecas, pois assim haveria mais pessoas a ler.
Sinceramente, é de lamentar os níveis de Português em Macau. Mesmo os que dizem falar a língua de Camões, na sua maioria, nem sequer conseguem compreender uma simples conversa pelo telefone.
Gostaria de saber que ensino se faz e como são avaliadas as pessoas que são contratadas por falarem Português.
E o mais grave é que estas pessoas estão convencidas de que falam Português. São situações como esta que devem ser abordadas pelo Governo. Muitos de nós começamos a pensar se será mesmo verdade e sincero o que se apregoa: que a língua portuguesa é importante e deve ser mantida em Macau.
Acredito, desde há muitos anos, que muitas profissões deveriam ser obrigadas a cursos de aperfeiçoamento e de actualização regulares. Defendo isto para quase todas as profissões e julgo que tal também se devesse aplicar a todos os funcionários públicos, no âmbito das suas funções, nomeadamente os que são contratados por dominarem as duas línguas oficiais. E não me refiro aos tradutores, mas sim aos normais funcionários que, por apenas referirem que falam Português na ficha de candidatura, ficam em vantagem em relação aos que o não falam.
Se um funcionário público é contratado devido à sua capacidade de falar Português, deveria ser, anualmente ou de dois em dois anos, avaliado para se saber se evoluiu (devendo ser promovido); se estagnou (deveria ser persuadido a progredir) ou se, pelo contrário, não tem conhecimentos suficientes para desenvolver as tarefas para as quais foi contratado (sendo neste caso obrigado a frequentar um curso de aperfeiçoamento ou, em caso mais graves, despedido ou transferido para outras funções).
Hoje em dia penso que, se um candidato a funcionário do Governo escrever no currículo que fala Português, quem o avalia levará isso em consideração na escolha. Mas, muito certamente, não se irá dar ao trabalho de verificar se tal é verdade. E quando se predispõe a verificar se o candidato realmente fala Português, muitas vezes é o próprio avaliador que não tem capacidade linguística para aferir os conhecimentos do outro. Quantas pessoas na Função Pública dizem falar Português e, na verdade, apenas dominam o básico?
Se as autoridades querem mesmo, e seriamente, apoiar o Português como língua oficial, devem começar a dar passos seguros e firmes, fazendo com que isso seja uma realidade e não se reduza apenas a umas linhas na Lei Básica.
Por outro lado, cabe a toda a comunidade portuguesa, e de falantes de Português, lutar diariamente para que isso aconteça.
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