O DESCARADO desrespeito pela língua portuguesa nos Serviços de Saúde (SS) continua, sem que ninguém faça nada para o contrariar.
Ainda não há muito tempo, aqui referi um episódio ocorrido no hospital, na especialidade de oftalmologia, que devido a problemas de comunicação acabou por gerar um problema nos olhos de uma paciente. Algo que os SS nunca reconheceram e apenas se dignaram a pedir desculpa por telefone. Como se meras desculpas resolvessem, neste caso, alguma coisa!
Agora, e como já vem sendo hábito há muitos anos, as comunicações em português são postas de parte.
Prestem atenção à documentação referente à vacinação da Gripe A H1N1. Existe documentação em chinês e em inglês; quanto ao português, nada se sabe. Sei que existe, mas não se encontra disponível nos locais onde se pode encontrar a informação nas outras duas línguas. Por vezes, ficamos com a impressão de viver em Hong Kong. Pena é que a qualidade do serviço aqui prestado nem lhe chegue aos calcanhares! Quem nos visita acha estranho e põe em causa o facto de não encontrar informação em português.
Em variados locais do território, nomeadamente nos locais públicos, encontram-se uns panfletos referentes à vacina, à sua função, efeitos e outras informações bastante úteis, Mas, para surpresa minha, nunca encontrei a versão portuguesa nos locais onde se vêem as versões em chinês e inglês. Encontram-se também uns formulários que se devem preencher antes de sermos vacinados e nos quais se informa o pessoal médico sobre vários detalhes que podem ser contraproducentes para quem leva a vacina. Só que, também neste caso, apenas consegui encontrar versões em chinês e inglês, o que, para muitas pessoas nascidas em Macau e aqui residentes há muitas gerações, os torna obsoletos, porque não lêem chinês (mesmo que o falem fluentemente) nem lêem inglês suficientemente bem para entenderem um questionário de carácter clínico.
Perante tal facto, e na esperança de encontrar alguma informação em português, tentei consultar a página do Centro de Coordenação da Língua, que se apresenta como trilingue! Mas, pelo que pude observar, o trilinguismo é só aparente. Ao tentar usar o link (
http://www.ssm.gov.mo/h1n1vaccine), que daria acesso directo à página, e passar a copiar o nome tal como aparece no cabeçalho, – «Vacinação da gripe pandémica (H1N1) 2009; Vacina “contra a gripe suína”», – deparo com uma página com título em português e em chinês, mas apenas isso. Tudo o resto constante dessa página informativa estava em chinês, sem qualquer forma de aceder à informação na outra língua oficial da RAEM.
Contactados os SS, através de um tal doutor Leong Iek Hou, do «Unit for Communicable Disease Prevention and Disease Surveillance» (!), fomos informados da existência desses panfletos em português, que nos foram enviados logo via email, mas todo este serviço foi feito numa linguagem algo «ríspida», pouco digna de quem tem por missão informar e ser prestável à sociedade.
A questão que aqui pretendo pôr em claro não é a da existência, ou não, da dita informação – aliás, mal estaríamos se a informação não fosse divulgada em português, – mas sim chamar a atenção para o facto do chinês e do português estarem em pé de igualdade nas leis que nos regem e que tal deve ser respeitado. De resto, um pouco à semelhança de Hong Kong, deveria ser o Governo o primeiro a dar o exemplo e mostrar todo o empenho e zelo em respeitar a Lei. Tal não acontece, neste caso concreto com os SS, que continuamente optam pelo inglês, por facilidade de comunicação. Acontece que o uso e respeito por leis não se coadunam com facilidades. A Lei é para ser cumprida, por muito difícil que seja. E, perante isto, não pode haver lugar para qualquer tipo de desculpa.
Quando dizem que não conseguem encontrar pessoal médico de Portugal para prestar serviço em Macau, só me dá vontade de rir. Das duas uma: ou não procuram, ou estão a atirar-nos areia para os olhos.
Apesar de não ser matéria da minha competência ou responsabilidade, eu próprio conheço, pelo menos, meia dúzia de profissionais da área que estariam disponíveis para vir para Macau! Portanto, não nos venham com «histórias» inventadas, ou de conveniência.
Para quem não saiba, profissionais a falar português podem encontrar-se não só em Portugal, como também no Brasil, Moçambique, Angola, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde, Guiné-Bissau e Timor Leste. A questão, pelo que me parece, tem a ver com a falta de vontade dos responsáveis e não com a dificuldade do recrutamento…