PELA décima vez está a ser levado a efeito o maior certame «gastronómico» de Macau. Coloco entre aspas o termo gastronómico porque, em minha opinião, para merecer tal designação deveria melhorar em muitos aspectos. É mais um arraial de comida e tudo ao monte, em que pessoas se empurram enquanto tentam engolir o que carregam nuns pratos de papel à procura de mesa. E quando têm a sorte de encontrar mesa, o mais certo é que ela esteja imunda e, em simultâneo, ter como vizinho do lado um indivíduo que arrota como se estivesse num restaurante japonês, pertencente, por isso, ao grupo dos que acham que arrotar alto e bom som é uma forma de mostrar ao «chefe» que estão satisfeitos!
Chan Chak Mo, presidente da União das Associações dos Proprietários de Estabelecimentos de Restauração e Bebidas de Macau, voltou a apresentar, uma vez mais, o certame com pompa e circunstância. E, mais uma vez também, o evento esquece uma das línguas oficiais da RAEM.
Começa a ser tradição e já ninguém liga. Ora, como o certame conta com milhões atribuídos pelo Governo, considero que os seus promotores deviam usar as duas línguas oficiais. Para que se saiba, só desde 2007 e de uma instituição do Governo, receberam mais de dez milhões de patacas, sem incluir a verba que vão usar este ano. É muito dinheiro vindo do bolso do Executivo e, mesmo assim, «atrever-se» a ignorar uma das línguas oficiais.
Com o encerramento previsto para depois de amanhã (21 de Novembro), a iniciativa contou, de acordo com a organização, com mais de uma centena de quiosques.
Como é normal neste tipo de arraial, a afluência popular é grande, assim como a confusão junto dos representantes que fornecem os petiscos mais «badalados». Como já vem sendo habitual, entre as barracas mais concorridas contam-se as dos representantes da culinária da Formosa e de alguns restaurantes locais que diariamente, nos respectivos locais de origem, cobram preços proibitivos.
De acordo com o deputado/presidente da União, estiveram representados grande parte dos estabelecimentos de Macau, abrangendo a culinária chinesa, asiática, macaense e europeia. Depois de ouvir as suas declarações, aquando da apresentação oficial do certame, fiquei «satisfeito» que não tenha referido que também haveria comida portuguesa. É que usar o termo europeu soa mais «in» e poupa-nos a explicações esfarrapadas, porque o que ali é servido em nada dignifica a culinária portuguesa tradicional. Se consideram que dignifica os outros tipos de comida, deixo isso ao critério de cada um e de quem lá vai com o intuito de satisfazer a sua gula gastronómica.
Aquele deputado, já por várias vezes interpelado sobre a falta da língua oficial portuguesa no certame, sempre se esquivou e recusou responder. Não sei o que o move, para não contemplar que se faça uso das línguas oficiais da RAEM, nem compreendo como é que o Governo, que acaba por pagar todas as contas, não obriga a que tal se cumpra. Não será uma questão de casmurrice, mas sim de princípio. Se usam dinheiros públicos e o certame diz querer promover a imagem de Macau, deveriam começar pelo mais elementar.
Importa respeitar o artigo 9 da Lei Básica, o qual diz claramente que, além da língua chinesa, se pode também usar a língua portuguesa. Aliás, quem vem de fora para nos visitar, faz sempre questão de salientar que consideram bastante positivo, e diferenciador, o facto de em Macau existirem duas línguas oficiais tão distintas. O próprio facto de termos uma língua oficial ocidental e outra oriental é factor de diferenciação e, caso tal desapareça dos certames turísticos, Macau não passará de um subúrbio pobre de Zhuhai.
O presidente da referida União, – que mais não seja por ser deputado da Assembleia Legislativa, – deveria ser o primeiro a defender o uso das duas línguas.