Quem assume a responsabilidade?
A SEMANA anterior foi dominada pelo incidente que envolveu a Companhia de Telecomunicações de Macau. Uma falha no serviço de comunicações, que deixou milhares de pessoas sem qualquer tipo de acesso à «Internet» ou ao serviço móvel de telecomunicações. Pessoalmente, a falha não poderia ter vindo em pior altura e até parece ter sido propositada. Aconteceu exactamente quando tinha agendada uma conferência telefónica com pessoas em Angola. Felizmente, tudo se resolveu com a boa compreensão do outro lado da linha, quando finalmente foi possível fazer uma chamada telefónica.
No meu caso, as perdas não foram avultadas; no entanto, imagino o que deverá ter acontecido com os bancos ou empresas que teriam contratos, encontros e outros detalhes da sua actividade profissional para essas horas em que estivemos isolados do mundo; ou com as pessoas que precisaram de telefonar para as emergências do hospital ou para os bombeiros, para que fossem assistidas numa situação de vida ou de morte!
Ainda ninguém se lembrou de quantificar os danos financeiros que essas horas causaram à população de Macau, ou as vidas que estiveram em perigo devido a essa falha; e, havendo manifestamente danos e perdas, financeiras ou não, saber a quem cabe a sua compensação e o assumir de responsabilidades.
A CTM resolveu a questão com uns pedidos de desculpas publicados na Imprensa e com a distribuição de umas patacas! Da próxima vez que me esquecer de pagar a conta, faço o mesmo para ver se cola! Com dinheiro e falta de vergonha tudo se resolve em Macau!
Lembro-me que, na primeira conferência de imprensa, logo após o incidente, o representante do Governo, o director dos Serviços de Regulação das Telecomunicações, deixou a achega dizendo que, apesar de ser positiva a reacção da CTM e a forma como lidou com o assunto sem tentar sacudir água do capote, há a necessidade urgente das empresas de telecomunicações criarem um sistema de emergência, para fazer face a estes incidentes. Caso o sistema principal falhe, tem de haver um de reserva, que possa ser imediatamente accionado, para que os utentes não sejam prejudicados e para que os serviços mínimos sejam acautelados.
Esta afirmação do responsável governamental constitui, para mim, uma novidade. Com efeito, pensava eu que a CTM, assim como as outras companhias, fossem obrigadas, na força da letra do contrato de concessão, a ter um sistema de emergência para fazer face a estes incidentes. Afinal, parece que não!
Esta clarificação vem levantar outras dúvidas. Será que as outras concessionários também não têm sistemas de emergência? O que acontecerá, se a Companhia de Electricidade de Macau for afectada por um problema que meta toda a rede eléctrica abaixo? Será que a CEM tem meios de, numa situação de emergência, fazer face à necessidade de assegurar o abastecimento de electricidade aos residentes e manter os serviços mínimos a funcionar? E a Sociedade de Abastecimentos de Água de Macau (que agora se chama Macao Water), será que tem capacidade de nos fornecer água, caso o seu abastecimento seja interrompido por qualquer razão?
São perguntas pertinentes que merecem alguma ponderação de quem elabora os contratos de concessão. Se não for precavido nestes contratos a necessidade de se assegurar o serviço, em casos graves de emergência, como poderá a população estar segura de que o serviço que paga não sofrerá qualquer interrupção?
É muito usual, em Macau, quando acontece este tipo de incidentes inesperados, resolver a situação com pedidos de desculpas. No meu entender, tal não chega e os responsáveis, sejam eles quem forem, devem ser punidos. Existe responsabilidade civil e criminal em acções destas e os responsáveis de topo das empresas envolvidas, em último caso, devem ser responsabilizados perante a justiça e a população. No mínimo, exige-se a sua demissão porque, afinal de contas, são eles os responsáveis máximos.
O residente comum, se não cumprir aquilo que se espera dele no local de trabalho, é chamado à atenção pelo seu patrão ou superior e, caso seja uma falha grave, acaba por ser posto na rua. Por que razão os responsáveis dessas empresas, ao colocarem milhares de vidas em perigo e atentarem contra os interesses económicos de toda a sociedade, ficam impunes?
Temos aqui muito que pensar e meditar para os próximos dias.