Esta semana o texto foi escrito a dois tempos. Mais parece que estava a adivinhar que iria escrever de música, mais concretamente do saudoso Clube de Jazz de Macau (CJM) que, após oito anos de ter «fechado» portas, ressurge agora com uma sessão promocional na Casa Garden. É amanhã, às dez da noite. Quem se deslocar ali para os lados do Jardim Camões será brindado com excelente música da antiga banda residente do CJM, os The Bridge, com algumas imagens sobre a história do clube e dos festivais internacionais que organizou desde Julho de 1985 e com uma «jam session» de artistas convidados.
Quer se goste ou não de jazz, a verdade é que Macau precisa de um clube desta natureza. Assim como precisa de teatros e de clubes de poesia e de outras artes semelhantes, em nome da diversidade cultural.
Quem vive em Macau desde o tempo da administração portuguesa lembra-se certamente das noites no CJM, primeiro na Rua das Alabardas (para quem não sabe é uma pequena rua na zona da igreja de São Lourenço) na porta da famosa parede de azulejos brancos e vermelhos. E, mais tarde, na Casa de Vidro, no NAPE. Especialmente este último local era visitado por muitos aficionados vindos de Hong Kong, visto que a abertura na zona nova da cidade coincidiu com o fecho do clube de Hong Kong. Era frequente ver pessoas influentes da política da região vizinha, sentados na esplanada da Casa de Vidro a ouvir as notas que vinham do espaço interior e a apreciar a vista do rio, ao anoitecer.
A debandada de Portugueses – a grande maioria dos sócios do clube, – e outros problemas, acabaram por ditar o fim daquele espaço e o encerramento do clube.
Este novo fôlego, na esperança de que seja o primeiro de muitos passos, vem dar novo ânimo a quem gosta deste tipo de música. O passo seguinte é convocar uma assembleia geral, para que seja eleita uma nova direcção, capaz de encontrar outro local.
A casmurrice de alguns, poucos, sócios que ainda vivem em Macau, merece ser enaltecida e a iniciativa receber apoio do Governo. Para tal espera-se que o Instituto Cultural, através do seu director, um manifesto apreciador do estilo, consiga encontrar meios que possam oferecer à cidade mais uma opção em termos musicais.
Subsídios só para alguns
A facilidade com que se criam associações em Macau está intrinsecamente ligada à forma como algumas delas conseguem angariar doações dos bolsos do Governo. Aliás, há quem defenda que existem tantas associações apenas porque o Executivo da Praia Grande abre o saco do dinheiro para o distribuir em tempos mais atribulados e usa este expediente de forma a acalmar os ânimos da população e dos cabecilhas dos grupos organizados.
Acontece que, caso seja particulares a pedir apoios para uma iniciativa, todas as portas se fecham! Algo de muito estranho se passa, quando um privado, em nome individual, se vê confrontado com a necessidade de pedir apoios para ser capaz de levar a cabo a sua iniciativa, seja ela uma exposição ou um evento. De nada vale que a mesma tenha como objectivo final promover a cultura, o desporto ou mesmo o nome de Macau local e internacionalmente. Se não tiver uma associação, ou não for amigo de um todo poderoso, nada feito! Todas as portas se fecham e a arrogância vem toda ao de cima nas instituições que deviam estar de portas abertas para apoiar tudo quanto tem a ver com Macau e as iniciativas dos seus residentes, independentemente da sua etnicidade ou «cor partidária» e contactos.
Há vários exemplos, nomeadamente de pedidos submetidos à Fundação Macau, a maior «apoiante» dos eventos em Macau, em nome do Governo. A mesma diz que só apoia eventos de «actividades de cooperação e intercâmbio com instituições ou entidades congéneres, ou cuja actividade seja compatível com os fins desenvolvidos por esta Fundação»! No entanto, se formos ver no Boletim Oficial o que se publica nas listas de verbas atribuídas, alguns dos apoios custam a encaixar nestes parâmetros. Mas a isto o Governo nada diz e deixa andar, sem que se apure os argumentos, apesar de, esporadicamente, alguns deputados se tenham vindo a insurgir na Assembleia Legislativa contra estas injustiças. Afinal, a Fundação pode fazer o que bem entender com as suas verbas, sem dar justificações a ninguém.
Episódios como este fazem-me lembrar toda a polémica relacionada com a Fundação Jorge Álvares (FJA), que tanta tinta fez correr nos primeiros meses de RAEM. A esta obrigaram a cancelar alguns apoios e a cortar subsídios, só porque pareciam «duvidosos». Critérios que não se entendem, tanto mais que na altura a FJA já nada mais tinha a ver com a RAEM.
Mas voltemos ao assunto principal. Caso um particular residente do território tenha a veleidade de pedir apoios para o quer que seja, as barreiras que encontra são mais do que muitas. Se for um particular «famoso», todos os problemas se resolvem. A questão que levanto é a seguinte: como pode um normal cidadão ser apoiado para organizar um evento, sem que tenha de andar a «lamber botas»? Certamente que se apresenta como tarefa impossível. Os critérios de atribuição, muitas vezes, dependem do facto de gostarem, ou não, da pessoa, nada tendo a ver com a essência do projecto.
Da lista dos apoios concedidos pelas maiores instituições de Macau, seria interessante serem conhecidos os projectos rejeitados e as razões por detrás de tal rejeição. Afinal, tratando-se de dinheiros públicos, o processo de aprovação e de rejeição deve ser totalmente transparente. No que diz respeito a dinheiros públicos, deveria haver uma total abertura perante a sociedade.
A este respeito, o sector privado parece querer dar bons exemplos. Nos últimos dias temos assistido a uma guerra entre o número um e o número dois da «Wynn Resorts», devido a um subsídio atribuído à Universidade de Macau. O caso cresceu tanto, que está mesmo a ser investigado pelas autoridades americanas, para que se apure a verdade dos factos. Claro que este exemplo é exagerado e as verbas envolvidas são de tal forma avultadas, que duvido que alguma vez Macau subsidie (ou apoie) algo nestes montantes. Mas o exemplo da transparência que a «Wynn Resorts» está a revelar, com tudo a ser resolvido pelas autoridades competentes, mostra que Macau e as suas principais fontes de subsídios e apoios pecuniários têm muito a aprender no que diz respeito às políticas de transparência na atribuição de apoios e subsídios a projectos locais.