SINCERAMENTE já começa a fartar o tanto atirar areia para os olhos de quem quer ver. O que se apregoa raramente tem reflexos na realidade e só não vê quem não quer.
A verdade é que em Macau, no papel, temos duas línguas oficiais e ambas, tanto quanto sei, devem ser tratadas em pé de igualdade. Portanto, por que razão a língua portuguesa acaba sempre por ser preterida em todas as actividades do Governo?
Como já ouvi de alguns causídicos portugueses estabelecidos em Macau, se temos que nos adaptar à realidade e estar preparados para interpretar as mensagens em Chinês, por que razão se meteu na Lei Básica que o Português é língua oficial?
Se for no sector privado, ainda percebo que não se use, apesar de considerar que, mesmo aqui, o Governo deveria promover o recurso às duas línguas oficias e mais a de comunicação internacional. Basta olhar para Hong Kong, onde o Governo gasta milhões a promover (mesmo na Comunicação Social) o ensino e uso do Inglês. Mas, quando se trata de comunicações do próprio Governo, não consigo aceitar. E isto não é ser radical; é apenas defender aquilo que marca a diferença em Macau.
Recentemente, recebi na caixa do correio lá de casa dois panfletos relativos à reforma do sistema político, algo que, pela sua importância, diz respeito a todos os residentes permanentes. Apesar de algumas consultas apresentarem resultados dizendo que os Portugueses não querem saber da política em Macau, eu, como cidadão permanente e responsável, preocupo-me com as questões políticas na RAEM. Afinal, essas mesmas questões, mais cedo ou mais tarde, irão ter repercussões na minha vida privada. Apenas por isso, se não por mais razões, já merecem toda a minha atenção, visto que não estou em Macau com mentalidade de emigrante. Quando aqui cheguei, este pequeno território estava ainda sob administração portuguesa; não cheguei como sendo emigrado a um país estrangeiro, mas sim como migrante. Apesar de não ter aqui nascido, sinto esta terra como minha e não tenho qualquer intenção de a deixar permanentemente. Nunca esteve, nem certamente estará no meu horizonte amealhar patacas para voltar às origens. Se assim fosse, talvez tivesse aproveitado outras benesses e já tivesse feito as malas!
O panfleto chegado à minha caixa do correio, como deve ter chegado a tantos outros domicílios, era sobre o Documento de Consulta sobre o Desenvolvimento do Sistema Político; só que apenas me chegou a versão em Chinês. E em duplicado!
Sendo um documento de extrema importância para o futuro de Macau e de todos nós, não deveria o Governo estar mais empenhado em fazer com que toda a população tenha acesso à informação? Não deveria o Governo ter dedicado mais atenção ao envio da informação nas duas línguas oficiais?
Uma fórmula simples para resolver estes problemas passaria por terem impresso os folhetos com as duas línguas, em vez de terem optado pela impressão de versões separadas. A própria separação indica, per si, discriminação.
São pormenores como estes que me levam a crer que a conversa da língua portuguesa é apenas para atirar areia para os olhos de quem quer ver. Se realmente estão empenhados em nos tratar como cidadãos iguais, independentemente da raça, credo, origens sociais ou qualquer outro diferenciamento, comecem a mostrar trabalho e empenho. Ou será que esse interesse só se irá manter enquanto for possível retirar proveitos económicos das relações com os Países de Língua Portuguesa?
O período de consulta foi de 10 de Março a 23 de Abril, amplo o suficiente para que os interessados pudessem apresentar as suas questões e opiniões. Eu próprio o fiz relativamente a alguns assuntos, apesar de concordar com a metodologia e com os pormenores do processo. Mais, em minha opinião, não se poderia esperar ou pedir, tendo em conta a realidade de Macau.
No entanto, tendo o período de consulta terminado no passado dia 23 (segunda-feira), por que razão enviaram os panfletos apenas na semana anterior? Os meus, em Chinês, chegaram no dia 16 ao domicílio.
Entretanto, visto serem apenas em Chinês, através de uma conversa telefónica aconselharam-me a ir levantar a versão portuguesa. Ou, caso preferisse, poderiam enviar-me a cópia em Português!
Apenas deixo uma questão: por que razão terão os leitores de Português ser discriminados e obrigados a telefonar, para pedir que lhes enviem algo que consigam ler?
Gostaria de saber se, para um tratamento igual das línguas, no próximo envio, o farão apenas em Português, para que os leitores de Chinês peçam a versão que conseguem ler, via telefone. Isso, sim, seria tratamento igual perante o Governo de Macau!
Realmente já cansa tanta falta de consideração, perante tanta retórica rota!
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