Feliz Natal a todos!
TODOS os anos o mesmo ritual... As ruas iluminam-se, o tempo arrefece e, como que por magia, todos se conhecem e se tornam mais amáveis, distribuindo os cumprimentos e sorrisos que durante o ano mantiveram escondidos numa gaveta esquecida, mas que agora vêem a luz do dia.
No Natal gosto sempre de relembrar uma história que me foi contada, quando ainda andava na escola primária, e que tenta mostrar o ridículo de nos apegarmos a coisas materiais, tão típico das nossas gerações. É a história da menina e do papel de embrulho dourado. Uma história antiga, mas intemporal, como são todas as histórias com moral.
Nas vésperas de Natal, o pai, vendo que a menina tinha usado o caro papel de embrulho dourado deu-lhe um sermão, pois viviam-se tempos de pouca abundância e aquele papel estava destinado a algo mais nobre. Pior ainda ficou, quando viu, no dia de Natal, que ela tinha usado o papel para embrulhar uma velha caixa de sapatos. No entanto, quando a menina lhe disse que era a prenda para ele, sentiu-se culpado e pediu-lhe desculpas. Ao abrir o presente, deparou com a caixa vazia, tendo ficado novamente irado, gritando para a filha e dizendo-lhe que era de muito mau gosto dar como prenda uma caixa cheia de nada, vazia. A menina, lavada em lágrimas, disse-lhe que não estava vazia, estava cheia de beijos que ela tinha soprado para o seu interior até que ficasse cheia. Assim, o pai teria beijos dela durante todo o ano, mesmo se ela não estivesse com ele. Ao ouvir isto, o pai ficou sem palavras e, arrependido de toda a cólera, desdobrando-se em pedidos de desculpas, chorou de alegria, enquanto abraçava a sua menina.
Passados alguns dias, num acidente, a criança faleceu e, desde esse dia, o pai nunca mais largou a caixa dourada. Sempre que se sentia sem forças para continuar a enfrentar problemas, tirava da caixa os beijos imaginários e lembrava-se do amor incondicional da sua filha e do tempo que perdeu aborrecido com ela, por causa de um simples papel dourado.
Infelizmente, o Natal, como o conhecemos agora, tornou-se uma época puramente mercantil que pouco ou nada tem para dizer, a não ser compras e consumismo. O aspecto religioso, sentimental e fraterno, há muito foi esquecido e substituído pelas árvores enfeitadas de luzes e fitas, mais ou menos reluzentes. Neste «carnaval» de ideias institucionalizadas reina uma figura bonacheirona e de barbas, patrocinada por uma bebida americana, o «Pai Natal», que nada tem a ver com a tradição, de que me falaram quando era mais novo, e com esta época que visa festejar o nascimento do Menino Jesus e a amizade entre os povos.
Em Macau, a reboque de toda a febre mercantil e da necessidade do Estado gastar dinheiro para alimentar os grupos de interesse que ajudam a manter os líderes no poder, fazem da cidade uma autêntica árvore de Natal, no seu sentido mais pejorativo. Os enfeites e grinaldas são de tal forma abundantes, que o misticismo e tradição que deveria povoar esta quadra ficam ofuscados com tanto brilho.
É uma pena que, devido aos interesses económicos, se tenha descuidado todo o lado positivo ligado à celebração do nascimento de Jesus e à festa do Natal. Nos dias de hoje, como vivemos numa economia de mercado, não se pode dissociar esta quadra de todas as vantagens monetárias que dela podem advir. Só que os proveitos económicos acabaram por relegar para segundo plano a verdadeira essência do que se festeja e a dita caixa dourada fica esquecida num canto poeirento.
A maioria, se não mesmo a totalidade dos jovens de hoje, não faz ideia da razão de festejar o Natal, quanto mais do valor simbólico da Ceia de Natal, do bacalhau cozido ou do peru recheado (dependendo da zona). Tudo nesta época tem um valor simbólico e cada peça tem um papel a desempenhar, tal como aquela caixa dourada teve para mostrar que nada deve ser mais importante do que darmos atenção e carinho a quem nos está próximo. Tudo o resto é efémero.
Muitos de nós levamos ao extremo o facto da época de Natal ser também conhecida como de paz e harmonia. Instintivamente, nesta quadra, passamos a ser mais cordiais e mais bem dispostos, enchendo as ruas da cidade de sorrisos e de cumprimentos. Seria bom que fosse Natal todos os dias e não apenas quando o Homem quer!
Acreditando-se ou não nas doces histórias de Natal, todos nós temos uma caixa dourada cheia de amor e beijos, daqueles que nos são mais queridos e mesmo de pessoas que nos são totalmente desconhecidas, mas que também merecem o nosso respeito. Todos os outros bens que possuímos não são mais do que objectos materiais que nada dizem.
O mais importante é mesmo o amor de quem nos está próximo. Assim como o amor e carinho que podemos mostrar durante todo o ano para com quem nos cruzamos no dia-a-dia.
Se soubermos cuidar da nossa caixa dourada, não haverá tempo para outras preocupações e todos os problemas relacionados com bens materiais nos parecerão muito mais fáceis de resolver.
Em Macau, nos outros onze meses do ano, muitas pessoas parecem esquecer a caixa dourada daqueles que amam e lhes são queridos.
Lembram-se em Dezembro, o que já não é mau!
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